Jotabasso Entrevista: “Precisamos fazer uma revolução interna para conseguir viver no século 21”

Pesquisador fala sobre choque de gerações e dá dicas para que mais experientes possam conquistar jovens sucessores

Dado Schneider pesquisa o comportamento humano e hábitos de consumo há 40 anos. Publicitário, mestre e doutor em Comunicação pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC/RS), Dado foi executivo de Marketing da marca de telefonia Claro sendo, inclusive, o criador do nome da empresa.

Atualmente, viaja pelo Brasil e exterior compartilhando estudos sobre a geração Z, grupo que compreende jovens nascidos a partir do ano 2000, ou a partir de 1995, como algumas vertentes de pesquisa afirmam. De toda forma, como o próprio Dado reforça, essa geração tem características únicas, comportamentos diferentes daqueles observados nos nascidos nos anos 80, ou antes disso.

Na entrevista abaixo concedida a Sementes Jobatasso, Dado fala sobre os desafios enfrentados pelos mais experientes no relacionamento com os mais novos, e como é possível gerenciar possíveis conflitos entre as gerações, inclusive quando o assunto é sucessão familiar nas empresas rurais.

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JB – Você costuma dizer que somos adultos inéditos. O que isso significa e quais são os desafios enfrentados por esses adultos, pessoas nascidas no século 20, e que agora estão situados no século 21?

Eu venho dizendo que nós somos adultos inéditos porque verdadeiramente nunca houve adultos iguais nós. Em primeiro lugar, os adultos do século 20 tinham uma expectativa de vida de 60 e poucos anos; no final do século, de 70 e alguma coisa. Mas a perspectiva que temos hoje é de irmos até os 100 anos de idade com capacidade de trabalharmos até, no mínimo, 90 anos. Quando eu falo 100 anos de idade, as pessoas ficam pensando em alguém que hoje tem 100, que realmente é um herói, uma heroína. Mas, não. Quando eu falo em 100 anos de idade daqui 30 ou 40 anos, é uma pessoa que equivale a alguém que está em uma academia de ginástica, ou em um pilates com 70 e muitos anos, e que se cuida. São pessoas que dão inveja da saúde que têm. Este é o adulto de 100 anos.

Então nós somos adultos inéditos porque vamos experimentar ter outras profissões depois de ter parado de trabalhar, vamos experimentar uma aposentadoria que jamais vai pagar o que a gente vai precisar para viver, então vamos ter que trabalhar para viver, porque a aposentadoria de hoje se pensa até os 80 anos, mas vamos ter que pensar em como viver até os 100 se sustentando. Nós somos adultos inéditos porque nós vamos enfrentar mudanças que nenhum outro adulto na história da humanidade teve de enfrentar.

JB – Como a necessidade de mudança e de se abrir para o novo está atrelada ao sucesso dos negócios atuais?

A abertura ao novo está atrelada, não só aos negócios, como à vida da pessoa como um todo. Eu costumo dizer que mudar não é necessariamente gostar do que está acontecendo, hoje, mudar é entender o que está acontecendo para ver se consegue aceitar. Na minha visão, mudar é entender para aceitar. Porque o mundo está muito complexo e nós, que fomos criados no século 20, com os padrões e regras do século 20, temos que fazer uma revolução interna para conseguir viver no século 21 porque ele é muito complexo para o que fomos ensinados.

E obviamente que isso se refere não só ao plano pessoal, mas também ao plano profissional porque há mudanças dentro das organizações. Não importa o tamanho, se pequena, média ou grande, ou até imensa – as organizações sempre foram verticais: a autoridade era imposta, vindo de cima para baixo. E, hoje, nós vemos que temos uma vida profissional que é na horizontal, nós trabalhamos em rede, nós trabalhamos um cooperando com o outro, e os profissionais mais jovens não conseguem aceitar uma autoridade que seja imposta. Os jovens respeitam autoridade, mas hoje a autoridade tem que ser conquistada. Então, abrir a cabeça para mudança não é só viver melhor como pessoa, mas viver melhor como profissional e render mais porque, verdadeiramente, quando a gente aprende a trabalhar em grupo, a gente vai mais longe.

JB – Quais características do jovem atual são um desafio quando o assunto é sucessão familiar nas empresas rurais?

Os jovens atuais são muito diferentes do que foram os jovens do século 20. Os jovens atuais são talvez a primeira geração nascida sem preconceitos; eles não discriminam as pessoas por cor de pele, nem por grau de escolaridade, nem por gênero, nem por faixa de renda, então eles são completamente diferentes dos jovens do passado.

Eles já nascem aprendendo trabalhar em rede, a fazer trabalho em grupo de escola em rede, eles têm uma vida plural e eles têm também uma visão global do mundo, a internet e as rede sociais propiciaram isso, então eles têm uma tendência a ser nômades, nômades digitais como se fala, eles têm a tendência a querer conhecer o mundo. Os jovens do passado foram criados para ter carreiras e os jovens de hoje querem ter experiência.

Uma outra característica muito forte é que o jovem do passado queria ter coisas e os jovens de hoje querem apenas ter acesso às coisas, a viagens, serviços, produtos e marcas. Isso impacta muito a questão da sucessão familiar. Eu sou muito cuidadoso nas palestras para o mundo agro porque, tradicionalmente, o negócio foi passado de pai pra filho, ou de mãe pra filho, ou de pai pra filha, sendo na maioria dos casos de pai pra filho.

E hoje nas minhas palestras eu primeiro preparo a plateia, e faço questão de falar isso: que primeiro preparo a plateia para falar a coisa mais dura que eu posso falar numa palestra, que a geração nascida neste século é a primeira geração que nasceu exclusivamente para ser herdeira, ela não se sente na obrigação de ser sucessora. Para fazer um jovem de hoje ser sucessor de alguém, ou suceder alguém num negócio familiar, esse negócio tem que ser muito atraente para o jovem, tem que ser muito interessante, e eu sugiro que, antes de passar o bastão para um jovem, o negócio da família, que faça esse jovem viajar bastante pelo mundo, ter bastante experiências, inclusive profissionais, que vão capacitá-lo ou capacitá-la a ser um bom sucessor, uma boa sucessora. Mas eu reforço: eles são mais herdeiros do que sucessores.

JB – O que as gerações mais experientes podem fazer para que o choque de gerações seja bem gerenciado? Ou seja, como despertar o interesse e o engajamento do jovem do século 21 por profissões tão antigas como a agricultura e os negócios rurais?

Não estou querendo ser do tipo que fica protegendo, um super-protetor de jovens, mas o choque de gerações que hoje estamos vivenciando é talvez um dos maiores de toda a história. E quando há um choque de gerações, pergunto a você que está lendo essa entrevista: quem, em um confronto entre uma pessoa experiente e uma pessoa jovem – que é inexperiente – quem tem mais capacidade de ceder, estender a mão e tentar se aproximar? Obviamente que é a pessoa mais velha, mais experiente.

Eu tenho um bordão que utilizo nas minhas palestras que é: “o mundo mudou bem na minha vez” porque, verdadeiramente, quando eu era jovem, tinha que adaptar aos velhos. E, agora que estou ficando velho, tenho que me adaptar aos jovens. Mas talvez seja uma boa mudança que o século 21 tenha trazido, que é a necessidade das pessoas mais vividas se aproximarem dos jovens, conhecer a vida deles, usar a linguagem deles… Pra que eles sintam vontade de estar com as pessoas mais velhas e, principalmente, de trabalhar com elas e de sucedê-las.

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